O objetivo principal das mudanças
ocorridas na contabilidade pública foi resgatar seu verdadeiro objeto de
estudo, o patrimônio público e não somente o controle do orçamento.
Para que isso pudesse ser possível, foi
necessário separar os dois cenários: orçamentário e patrimonial, ambos
fundamentados pela Lei 4.320/64. Dessa forma o orçamento deixou de ser o
protagonista na administração pública, passando esse título para o
patrimônio.
Mesmo com essa separação e mudança, o
orçamento continua exercendo o papel de extrema relevância no controle
político, administrativo e de planejamento do governo com o
estabelecimento na previsão das receitas e fixação das despesas.
O setor público brasileiro acostumou-se a
não ter o controle patrimonial, por isso, a contabilidade pública sob o
enfoque patrimonial veio promover informações mais abrangentes e
transparentes na administração pública e trazendo grandes repercussões
para diversos setores, inclusive para seus respectivos gestores.
Palavras-Chave: Contabilidade pública, patrimônio, administração, gestor.
- INTRODUÇÃO
Nos tempos atuais tem sido necessária a
comparabilidade das informações contábeis no tempo e no espaço.
Organismos internacionais, entidades diversas e a sociedade buscam
conhecer cada vez mais a situação fiscal e patrimonial das entidades e
órgãos da administração pública.
Para atender essa necessidade, o Brasil
buscou a convergência da contabilidade pública aos padrões
internacionais, visando adequar conceitos, registros e demonstrações.
Independente da exigência formal da
adequação, nossa gestão necessitava de uma contabilidade pública que
pudesse refletir, evidenciar e dar a dimensão do patrimônio público de
forma tempestiva.
O Brasil nunca teve conhecimento de seu
real patrimônio, o enfoque da contabilidade pública que durante anos era
orçamentário passa a ter o enfoque patrimonial e essa mudança tem
gerado grandes impactos na administração pública.
A contabilidade aplicada ao setor público é uma especialização da ciência contábil que tem como missão fornecer à administração informações sobre:
- a) Organização e execução do orçamento;
- b) Normas para o registro de entradas de receita;
- c) Normas para o registro de desembolso de despesa;
- d) Registro, controle e acompanhamento das variações do patrimônio;
- e) Normas para a prestação de contas dos responsáveis por bens e valores;
- f) Normas para a prestação de contas do Governo;
- g) Controle de custo e eficiência do setor público.
De forma paralela ao patrimônio, o orçamento continua a ser registrado e evidenciado pela contabilidade pública.
Diante deste cenário o artigo tem como
objetivo demonstrar as principais mudanças contábeis e os impactos na
gestão pública, em uma pesquisa qualitativa, por meio levantamento da
legislação brasileira, normatizações e obras bibliográficas.
Atendendo a pesquisa, o referido artigo
apresenta: (1) Introdução, (2) O Processo de convergência aos padrões
internacionais, (3) O Regime de caixa e o regime de competência, (4) Do
enfoque orçamentário para o enfoque patrimonial (5) Os paradigmas e (6)
Considerações finais.
A relevância deste artigo se justifica pelas grandes mudanças na contabilidade pública e pela necessidade de pesquisas de assuntos ligados à esta área.
- O PROCESSO DE CONVERGÊNCIA AOS PADRÕES INTERNACIONAIS
De acordo com Feijó (2013, p.53) o novo
modelo de contabilidade aplicada ao setor público visa resgatar a
Contabilidade como ciência e seu objeto de estudo: o patrimônio da
entidade pública. A Contabilidade é a ciência que aplica no processo
gerador de informações, os princípios e as normas contábeis direcionados
à gestão do patrimônio de entidades, oferecendo aos usuários
informações de natureza orçamentária, econômica e financeira do
patrimônio da entidade e suas mutações e sobre os resultados alcançados,
em apoio ao processo de tomada de decisão e à adequada prestação de
contas.
A mudança na Contabilidade Pública iniciou oficialmente quando o Ministério da
Fazenda publicou a portaria no184 de 25
de agosto de 2008, onde normatizou as diretrizes a serem observadas no
setor público, quanto aos procedimentos, práticas, elaboração e
divulgação das demonstrações contábeis convergindo com as normas
internacionais de contabilidade aplicadas ao setor público.
A portaria também atribuiu à Secretaria do Tesouro Nacional a responsabilidade do processo de convergência em consonância com os pronunciamentos da International Federation of Accountants - IFAC e as normas do Conselho Federal de Contabilidade.
Assim iniciou o processo de convergência
das práticas contábeis no setor público brasileiro e neste mesmo ano o
Conselho Federal de Contabilidade publicou as dez Normas Brasileiras de
Contabilidade Aplicadas ao Setor Público – NBCASP.
Com o advento das normas editadas pelo Conselho Federal de Contabilidade, o orçamento deixa de ser o principal input contábil, passando a ser o secundário e o patrimônio passa a ser o principal.
Os atores do processo de convergência são:
- a) Conselho Federal de Contabilidade – CFC: Responsável pela gestão
do processo de tradução e convergência aos padrões internacionais.
Instrumentos: Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor
Público – NBCASP.
- b) Secretaria do Tesouro Nacional – STN: Responsável pela gestão da
execução do processo. Instrumento: Manual de Contabilidade Aplicada ao
Setor Público – MCASP, capacitação e disseminação.
- c) Grupo Técnico de Procedimentos Contábeis – GTCO: Grupo realizado
pela Secretaria do Tesouro Nacional. Instrumento: Participação da
Federação na elaboração das Normas.
- d) Tribunais de Contas: Responsável pela fiscalização dos gestores no que se refere aos novos padrões contábeis.
- e) Gestores Públicos: Responsável de provimento de recursos para a efetiva implantação das novas regras contábeis.
- O REGIME DE CAIXA E O REGIME DE COMPETÊNCIA
O conceito de regime de caixa é bem
simples, as transações e os eventos são contabilizados no momento em que
ocorrem. As receitas são contabilizadas pela sua arrecadação e as
despesas no desembolso Este regime mede o resultado de um determinado
exercício financeiro, a partir da diferença entre a arrecadação e os
desembolsos.
Através do regime de caixa são
reconhecidos poucos ativos, apenas os com elevado grau de liquidez, como
por exemplo: Saldo em dinheiro, saldos em conta correntes, saldos de
investimentos.
Segundo Carvalho e Pigatto (2010) a
falha do regime de caixa reside no fato de não fornecer informações
sobre outros ativos e passivos. Centrando-se apenas no fluxo de caixa do
período, ignorando outros fluxos de recursos que afetam a capacidade do
governo prestar benefícios atuais e futuros à população.
Esta prática ao logo dos anos, permitiu
que os sistemas contábeis evoluíssem nos processos de acompanhamento e
controle da execução orçamentária, com a implementação de sistemas
sofisticados de controle financeiro. Silva (2009, p.45) O regime de
competência é capaz de registrar as receitas quando nasce o crédito em
favor do Ente mediante o lançamento tributário efetuado pelo órgão
competente e de reconhecer as despesas em função dos compromissos ou
obrigações assumidas.
Este regime está inserido aos princípios
da ciência contábil, que deve ser, na prática, estendido a qualquer
alteração patrimonial, independentemente de sua natureza e origem.
- DO ENFOQUE ORÇAMENTÁRIO PARA O ENFOQUE PATRIMONIAL
A doutrina contábil, que por diversos
autores acabaram por consagrar com base em uma interpretação equivocada
do artigo 35 da Lei 4.320 (BRASIL,1964)
Art. 35. Pertencem ao exercício financeiro:
I – as receitas nele arrecadadas;
II – as despesas nele legalmente empenhadas.
Observa-se que a contabilidade do setor
público adota como regime contábil o regimemisto, ou seja, regime de
competência para as despesas e de caixa para a receita. Filho (2014, p.
3).
O primeiro passo para essa transição foi
resgatar os princípios e postulados da ciênciacontábil, assim como
qualquer outro ramo da ciência contábil, a contabilidade aplicada ao
setor público obedece aos princípios de contabilidade.
4.1. Os princípios contábeis.
No âmbito legal brasileiro, o Conselho
Federal de Contabilidade é o órgão responsávelpela normatização e
fiscalização do exercício do profissional de contabilidade e, para
tanto, com fundamento na Lei 12.249 de 11-6-2010, edita resoluções com
vistas a disciplinar as Normas Brasileiras de Contabilidade, de natureza
técnica e profissional, e regular os Princípios de Contabilidade. Rosa
(2013, p.313) Conforme Resolução 750/1993 editada pelo
Conselho Federal de Contabilidade, osprincípios contábeis são:
Entidade, Continuidade, Oportunidade, Registro pelo valor original,
Prudência, Competência.
4.2. A perspectiva do setor público sob os princípios contábeis.
- a) Princípio da Entidade: Para o Ente público, o patrimônio se
afirma pela autonomia, originária de sua destinação social, porém os
gestores público que o administram são obrigados a prestarem contas de
sua gestão.
- b) Princípio da Continuidade: No âmbito da entidade pública, a
continuidade está vinculada a continuidade de suas atividades
operacionais e finalísticas, com o cumprimento da destinação social de
seu patrimônio.
- c) Princípio da Oportunidade: É base indispensável ao processo de
mensuração e apresentação dos componentes patrimoniais dando relevância e
confiabilidade a informação contábil.
- d) Princípio do Registro pelo valor original: O registro dos fatos e atos contábeis será
considerado o valor original dos
componentes patrimoniais, ou seja, valor resultante de consenso de
mensuração entre os agentes internos ou externos, com base em valores de
entrada.
- e) Princípio da Prudência: No momento que as estimativas afetam o
patrimônio líquido, determina-se a mensuração como o menor valor para o
ativo e o maior valor para o passivo. A adoção deste princípio na
administração pública não deve ter excessos ou situações classificáveis
como manipulação do resultado, ocultação de passivos, super avaliação ou
subavaliação de ativos.
- f) Princípio da Competência: Aplica-se o princípio da competência em sua integralidade.
O princípio da competência é aquele que
reconhece as transações e os eventos nos períodos a que se referem,
independentemente de seu pagamento ou recebimento. Conforme Resolução do
Conselho Federal de Contabilidade – CFC no 1282/2010.
Art. 9º O Princípio da Competência
determina que os efeitos das transações e outros eventos sejam
reconhecidos nos períodos a que se referem, independentemente do
recebimento ou pagamento.
Parágrafo único. O Princípio da Competência pressupõe a simultaneidade da confrontação de receitas e de despesas correlatas.
Segundo Feijó (2013, p.126) é o princípio cuja interpretação equivocada por muito tempo mais causou danos à contabilidade do setor público.
A contabilidade pública sob o regime de competência passará a maiores níveis de detalhamento, como por exemplo:
- a) Conhecer de necessidade de caixa;
- b) Avaliação de cumprimento de suas atividades e compromissos;
- c) Posição financeira do governo;
- d) Avaliação de desempenho em termos de custo, eficiência e realizações.
O segundo passo para a transformação
deste enfoque veio com a edição das dez Normas Brasileiras de
Contabilidade Aplicadas ao Setor Público – NBCASP pelo Conselho Federal de Contabilidade – CFC.
As normas são um instrumento para elevar
a eficiência e efetividade das Leis, quanto aos seus objetivos de
promover o planejamento, a transparência e a responsabilidade fiscal.
Vieira (2010 p. 131)
A adoção destas normas traduz um grande progresso para a contabilidade pública no Brasil. Conferindo bases mais sólidas e científicas aos fenômenos e transações do setor Público
4.3. Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público – NBCASP
De forma sintetizada as dez normas são:
NBC T 16.1 – Conceituação, Objeto e Campo de Aplicação
Esta norma define a contabilidade
aplicada ao setor público como uma ciência queaplica em seu processo de
gerar informações, os princípios de contabilidade e as normas contábeis
voltadas ao controle patrimonial de entidades do setor público.
NBC T 16.2 – Patrimônio e Sistemas Contábeis.
Esta norma estabelece a definição de
patrimônio público e a classificação dos elementos do ativo e passivo
sob o aspecto contábil em circulante e Não-circulante.
Apresenta a estrutura de informações
contábeis em cinco subsistemas: orçamentário, financeiro, patrimonial
custos e compensação. A grande novidade é a criação do subsistema de
custos a ser implantado na gestão dos recursos.
NBC T 16. 3 – Planejamento e seus Instrumentos sob o Enfoque Contábil.
Esta norma estabelece bases para o controle contábil sobre o planejamento de
entidades públicas, planejamento este
dado em planos interligados hierarquicamente, sendo eles na gestão
pública: Plano Plurianual, Lei de Diretrizes Orçamentárias e Lei
orçamentária Anual.
NBC T 16. 4 – Transações no Setor Público.
Conceitua as transações no Setor Público
os atos e fatos que alteram qualitativas ou quantitativas, efetivas ou
potenciais o patrimônio das entidades do setor público e reafirma que o
registro contábil deve respeitar os Princípios Fundamentais de
Contabilidade juntamente com as Normas Brasileiras de Contabilidade
Aplicadas ao Setor Público. A norma também trata das transações que
envolve valores de terceiros, caracterizadas como sendo aquelas que a
entidade do setor público é fiel depositária e outras que não afetam seu
patrimônio líquido.
NBC T 16.5 – Registro Contábil.
Estabelece critérios para o registro
contábil, as características desses registros e das informações
contábeis. Trata também do plano de contas contábil. A novidade fica na
orientação da ausência de norma
contábil, onde o profissional da contabilidade deve utilizar, nesta
ordem as normas nacionais e internacionais que tratem de temas
similares, evidenciando o procedimento em nota explicativa.
NBC T 16.6 – Demonstrações Contábeis.
Esta norma dispõe sobre as demonstrações contábeis que devem ser elaboradas:
Balanço Patrimonial, Balanço
Orçamentário, Balanço Financeiro, Demonstração das Variações
Patrimoniais, Demonstração dos Fluxos de Caixa, Demonstração do
Resultado Econômico.
NBC T 16.7 – Consolidação das Demonstrações Contábeis.
Esta norma estabelece conceitos,
abrangências e procedimentos para consolidação das demonstrações
contábeis das entidades públicas. Com o objetivo de demonstrar uma visão
global do resultado e a prática do controle social.
NBC T 16.8 – Controle Interno.
Esta norma trata do controle interno com
o objetivo de garantir a eficiência e eficácia dos sistema de
informação contábil. Segundo a norma compreende o conjunto de recursos,
métodos, procedimentos e processos com a intenção de proteger o
patrimônio público.
NBC T 16.9 – Depreciação, Amortização e Exaustão.
Esta norma estabelece os procedimentos e
critérios para o registro contábil da depreciação, amortização e
exaustão, devendo ser apurado mensalmente.
NBC T 16.10 – Avaliação e Mensuração de Ativos e Passivos em Entidades do Setor Público.
Esta norma estabelece critérios e
procedimentos para a avaliação e mensuração de ativos e passivos que
compõe o patrimônio das entidades do setor público.
O terceiro passo para a transição do
enfoque orçamentário para o enfoque patrimonial foi o desenvolvimento
dos procedimentos contábeis patrimoniais a serem aplicados na
administração pública, que são:
- a) Reconhecimento, mensuração e evidenciação dos créditos,
tributários ou não, por competência, e a dívida ativa, incluindo os
respectivos ajustes para perdas;
- b) Reconhecimento, mensuração e evidenciação das obrigações e provisões por competência;
- c) Reconhecimento, mensuração e evidenciação dos bens móveis, imóveis e intangíveis;
- d) Registro de fenômenos econômicos, resultantes ou independentes da
execução orçamentária, tais como depreciação, amortização e exaustão;
- e) Reconhecimento, mensuração e evidenciação dos ativos de infraestrutura;
- f) Implementação do sistema de custos.
- OS PARADIGMAS
Além de resgatar os princípios e postulados da ciência contábil e a edição das Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas
ao Setor Público, para que o enfoque patrimonial se tornasse uma
realidade, foi preciso quebrar diversos paradigmas como: a contabilidade
somente apresenta um regime contábil, regime misto, ou seja, a receita é
registrada na sua arrecadação e a despesa no momento do empenho, a Lei
4.320/64 não menciona o enfoque patrimonial, o registro de valores a
receber é impossível na administração pública, entre outros.
Segundo Silva (2009, p.45) os estudos de
contabilidade aplicada ao setor público tem sido limitados à
contabilidade orçamentária em face a da ênfase ao fluxo de caixa e às
necessidades de financiamento que constituem uma característica das
entidades sem finalidade lucrativa, como é o caso da atividade estatal.
Tal ênfase fez com que os sistemas contábeis limitassem os registros
patrimoniais aos fatos originários da execução orçamentária (receitas e
despesas de capital) ou à atribuição da responsabilidade pela guarda de
bens e valores aos agentes públicos (almoxarifados e bens patrimoniais).
A contabilidade pública sempre teve o orçamento como seu foco e por isso era seu único input contábil.
Tendo todos os seus registros realizados e acompanhados, juntamente com
a gestão dos recursos. Porém o objeto da contabilidade é o patrimônio
público e para que isso aconteça, todos os fenômenos que o afeta devem
ser registrados.
O artigo 85 da Lei 4.320 (BRASIL, 1964) estabelece que:
Art. 85. Os serviços de contabilidade
serão organizados de forma a permitirem o acompanhamento da execução
orçamentária, o conhecimento da composição patrimonial, a determinação
dos custos dos serviços industriais, o levantamento dos balanços gerais,
a análise e a interpretação dos resultados econômicos e financeiros.
Em análise, o entendimento fica claro
que desde 1964 já existe a preocupação com a contabilidade patrimonial e
o fato de não pactuar com a ocultação de nenhum elemento de seu
patrimônio, seja do ativo ou do passivo, mas não há como apontar o real
motivo do enfoque ter sido orçamentário durante todo esse tempo, ou
seja, desde o advento da Lei 4.320/64.
Possivelmente a falta de informação da
ocorrência do fato gerador e a dificuldade de se mensurar o quanto se
tem a receber, tenham motivado contadores e gestores a adotar o regime de caixa.
Segundo Aquino e Mario (2010) essas
justificativas tenham sido razoáveis quando a Lei 4.320/64 tenha entrado
em vigor. Entretanto o avanço tecnológico ocorrido na última década reduz a assimetria informacional,
visto a implementação digital do sistema público de escrituração fiscal
– SPED e a nota fiscal eletrônica podem proporcionar estimativas
acuradas quanto ao crescimento patrimonial da entidade pública e
consequentemente a probabilidade de seu efetivo recebimento.
No entendimento de Feijó (2013, p.100)
em primeiro lugar, deve-se atentar que a contabilidade patrimonial é bem
mais complexa, pois enseja a aplicação integral do princípio da
competência para garantir o reconhecimento de todos os ativo e passivos.
Em segundo, destaca-se a demora do país em ter seu grande marco
regulatório nesse tema, que aconteceu 12 anos depois, com a aprovação da
Lei 6.404/76. O terceiro ponto é que, no final da década de 1970, o
país vivia uma escalada crescente da inflação que se transformaria na
década seguinte, em um período de hiperinflação, somente debelada em
1994.
Mesmo com a mudança do enfoque contábil, o orçamento continua sendo um
instrumento de extrema importância na gestão pública. Por isso seus registros continuam sendo realizados.
Segundo a Secretaria do Tesouro Nacional – SNT. Manual de Contabilidade Aplicada
ao Setor Público. Procedimentos Contábeis Patrimoniais: (2013. p.9). A contabilidade aplicada ao setor público deve seguir
além dos princípios contábeis, as normas de direito financeiro, em
especial o artigo 35 da Lei 4.320 (BRASIL, 1964) que instituiu o regime
orçamentário.
Art. 35. Pertencem ao exercício financeiro:
I – as receitas nele arrecadadas;
II – as despesas nele legalmente empenhadas.
Ao mesmo tempo, os artigos 89, 100 e 104 da Lei 4.320 (BRASIL, 1964) estabelece que:
Art. 89. A contabilidade evidenciará os fatos ligados à administraçãoorçamentária, financeira patrimonial e industrial.
(…)
Art. 100 As alterações da situação
líquida patrimonial, que abrangem os resultados da execução
orçamentária, bem como as variações independentes dessa execução e as
superveniências e insubsistência ativas e passivas, constituirão
elementos da conta patrimonial.
(…)
Art. 104. A Demonstração das Variações
Patrimoniais evidenciará as alterações verificadas no patrimônio,
resultantes ou independentes da execução orçamentária, e indicará o
resultado patrimonial do exercício.
Conforme análise na Lei 4.320/64,
juntamente com o Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público –
MCASP (2013), os fatos orçamentários devem ser registrados e
evidenciados e os fatos ligados à execução financeira e patrimonial
evidenciados de maneira que os modificativos sejam levados para contas
de resultado permitindo o conhecimento da composição patrimonial e dos
resultados econômicos e financeiros de determinado exercício.
Para que não ocorra a falta de harmonia entre o orçamento e o patrimônio, ou seja, que a Lei 4.320/64 não seja atendida por completa, a receita terá seu registro sob o enfoque patrimonial, com a denominação de
“variação patrimonial aumentativa” e no momento da arrecadação, o
registro em contas específicas do orçamento.
- OS IMPACTOS NA GESTÃO PÚBLICA
A contabilidade patrimonial
proporcionará aos gestores públicos, uma visão completa do patrimônio
público, não somente a execução do orçamento, mas também seus ativos e
passivos.
Para o Tribunal de Contas do Mato Grosso
– TCE-MT, (2011, p.19) é muito importante separar as áreas e o momento
de atuação. A responsabilidade pela evidenciação do patrimônio é do
contador, mas os atos que darão base a essa evidenciação, como
elaboração do inventário, depreciações, reavaliações, levantamento de
passivos, obrigações, entre outros, são atribuições de setores
específicos e de comissões designadas especificamente para esses fins,
sob a responsabilidade dos administradores e gestores públicos.
A implantação deste processo permitirá a
criação do sistema de custo no setor público com consequência direta na
qualidade e eficiência do gasto. Teoricamente podemos até afirmar que se o setor passar a gastar melhor poderá cobrar menos recursos da sociedade.
Outro ponto de impacto é o aumento da transparência das atitudes dos gestores.
Para Silva (2009, p.340) a noção de transparência no âmbito governamental é cada vez mais empregada em países que defendem o processo democrático de acesso às informações sobre a ação dos gestores públicos.
Com o enfoque patrimonial, a
contabilidade passa a fornecer informações relevantes para o
planejamento sobre os recursos utilizados e os resultados obtidos,
juntamente com a avaliação da eficácia e atribuição de responsabilidade
pela eficiência, viabilizando a identificação de contingências ativas e
passivas. Esse cenário constitui em uma gestão coerente com a
identificação dos atuais passivos e ativos.
Desta forma a responsabilidade do gestor
não estará mais apenas na execução orçamentária e financeira, mas agora
também nos ativos e passivos que estarão sob sua administração. Somente um resultado de
superávit financeiro não será capaz de avaliar se a gestão dos recursos
públicos foi eficiente, o gestor poderá alcançar esse superávit, mas se o
patrimônio estiver dilapidado, a contabilidade irá apontar em suas
demonstrações.
Para que o gestor consiga atender as
Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público será
necessário avaliar a maturidade de várias áreas e preparar um plano de
ação para a melhoria da gestão contábil, juntamente com o Contador.
As principais dimensões estratégicas são:
- a) Estrutura Organizacional: O gestor deverá verificar se a
contabilidade está formalmente estruturada, com cargos de funções,
regimento interno e competências bem definidas.
- b) Plano de Contas: O Plano de contas é a ligação entre os conceitos
contábeis e as práticas. Aqueles Entes que possuem sistemas próprios,
enseja nível elevado de esforço para a implementação.
- c) Demonstrações Contábeis e Fiscais: Tais demonstrações são também
um desafio para os sistemas informatizados, contadores e gestores.
- d) Liderança: É necessário avaliar o apoio institucional e o envolvimento das lideranças com as ações e práticas contábeis.
- e) Recursos Humanos: Esta ação tem como o objetivo assegurar os
servidores capacitados e em número suficiente para desempenhar as ações
voltadas para as alterações contábeis. Afinal uma boa contabilidade não
existe sem profissionais qualificados.
- f) Tecnologia: Da mesma forma que uma boa contabilidade não existe
sem profissionais qualificados, o mesmo pode se dizer que sem um bom
sistema uma boa contabilidade também não será possível.
- g) Custo: A escassez de recursos pode determinar o sucesso da
implantação. Todos os custos devem ser estimados antes do início do
processo.
É importante que os gestores públicos,
administradores, ordenadores de despesas, secretários e demais agentes
públicos tenham noção do atual momento e que decisões sejam tomadas numa
visão macro, dos órgãos de gestão para os de execução.
- CONCLUSÕES FINAIS
A contabilidade pública vive uma nova
era, uma nova realidade. Agora serão evidenciados direitos e
responsabilidades que vão além da atual gestão, que permitirá um maior
controle social e também que os gestores tenham conhecimento dos ativos e
passivos em sua totalidade.
Entre o regime de caixa que ainda é
aplicado na contabilidade pública e que impede o atendimento total da
Lei 4.320/64, o regime de competência é o mais completo, visto
incorporar as funções do regime de caixa e ainda acrescentar diversas
informações permitindo análises financeiras, orçamentárias, patrimoniais
e de custo.
O presente artigo teve como objetivo
mostrar que a mudança do enfoque orçamentário para o enfoque patrimonial
vem fornecer a administração pública um melhor retrato dos recursos disponíveis e do patrimônio
público, consequentemente gerando subsídios necessários para uma
condução adequada das políticas públicas.
Não há dúvida que o maior benefício institucional que será gerado pela contabilidade pública sob o enfoque patrimonial é a
transparência da gestão pública em todos os níveis Por isso recomendo
que novos estudos sejam realizados, buscando outros impactos, mas que
principalmente o gestor público utilize a contabilidade como uma
ferramenta estratégica em sua administração.
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